quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Constituição da Republica Portuguesa


Carácter geral da Constituição
A Constituição de 1976 é a mais vasta e a mais complexa de todas as Constituições portuguesas – por receber os efeitos do denso e heterogéneo processo político do tempo da sua formação, por aglutinar contributos de partidos e forças sociais em luta, por beber em diversas internacionais ideológicas e por reflectir (como não podia deixar de ser) a anterior experiência constitucional do país.
É uma Constituição-garantia e uma Constituição prospectiva. Tendo em conta o regime autoritário derrubado em 1974 e o que foram ou poderiam ter sido os desvios de 1975, é uma Constituição muito preocupada com os direitos fundamentais dos cidadãos e dos trabalhadores e com a divisão do poder. Mas, surgida em ambiente de repulsa do passado próximo e em que tudo parecia possível, procura vivificar e enriquecer o conteúdo da democracia, multiplicando as manifestações de igualdade efectiva, participação, intervenção, socialização, numa visão ampla e não sem alguns ingredientes de utopia.
Mas foi porque uns temiam pelas liberdades, outros pelos direitos dos trabalhadores, outros pelas nacionalizações e pela reforma agrária, outros pelo
Parlamento e pela separação dos poderes, outros ainda pela descentralização regional e local, que a Constituição acabou por ficar como ficou.
Como marcas de originalidade (ou de relativa originalidade) da Constituição apontem-se:
O dualismo complexo das liberdades e garantias e de direitos económicos, sociais e culturais e o enlace entre eles operado, designadamente pelo art. 17º;
A constitucionalização de novos direitos e da vinculação das entidades privadas pelos direitos, liberdades e garantias;
A recepção formal da Declaração Universal dos Direitos do Homem enquanto critério de interpretação e integração das normas sobre direitos fundamentais;
A perspectiva universalista traduzida no princípio da equiparação de direitos de portugueses e estrangeiros, nas garantias da extradição e da expulsão, na previsão do estatuto de refugiado político e, após 1982, na assunção do respeito dos direitos do homem como princípio geral das relações internacionais;
O apelo à participação dos cidadãos, associações e grupos diversos nos procedimentos legislativos e administrativos;
O tratamento sistemático prestado às eleições, aos partidos, aos grupos parlamentares e ao direito de oposição;
A redobrada preocupação com os mecanismos de controlo recíproco dos órgãos de poder e a constitucionalização do Ombudsman (o Provedor de Justiça);
A coexistência de semipresidencialismo a nível de Estado, sistema de governo parlamentar a nível de regiões autónomas e sistema directorial a nível de municípios;
O sistema abrangente de fiscalização da constitucionalidade – concreta e abstracta, de acção e de omissão, preventiva e sucessiva – e o carácter misto de fiscalização concreta, com competência de decisão de todos os tribunais e recurso, possível ou necessário, para a Comissão Constitucional, primeiro, e depois para o Tribunal Constitucional.
Os constituintes pretenderam ainda construir uma organização económica nova, conjugando o princípio da apropriação colectiva dos principais meios de produção, um socialismo autogestionário e a iniciativa privada. A realidade do país, as revisões constitucionais e a integração comunitária viriam mostrar que só poderia subsistir se entendida como economia mista ou pluralista, algo diferente, mas não oposta ao modelo típico de Estado social europeu.

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